Uma jovem de 19 anos desapareceu por alguns dias e, ao voltar, tinha uma tatuagem com o nome do ex no rosto.
A mãe da garota relata que esta é a terceira tatuagem que o ex faz na jovem, sendo que as duas primeiras, uma foi na virilha outra no peito.
Com um relacionamento conturbado, regado a ameaças e violência, essa já é a terceira vez que a mãe pede providências protetivas para a filha, contra o autor.
A jovem já teria se mudado de cidade em outra ocasião, mas teria voltado para a cidade por conta de uma oportunidade de emprego e aí acabou aceitando estabelecer novo contato com ex. No entanto, em um breve período, já percebeu que era má ideia e rompeu.
Foi aí que, com a ajuda do próprio pai (segundo relato da vítima), o autor a teria levado para a sua casa e a mantido em cárcere privado, sob intensa violência e ameaças e, nesse período, teria feito a tatuagem com o seu nome no rosto da jovem.
O ciclo do abuso
As relações abusivas começam como relações ideais, muitas vezes perfeitas.
Em geral, o abusador é muito convincente e sedutor, especialmente para com as pessoas em volta.
Isso dificulta muito para as vítimas romperem com o ciclo do abuso, primeiro porque elas precisam se convencer de que o abusador nunca vai mudar.
Segundo, porque as vítimas precisam convencer os outros de que aquela pessoa é abusador para depois obter alguma ajuda.
Enquanto isso, ela vai ser encorajada e perdoar, a voltar, a rever a relação etc, e acaba se mantendo no ciclo do abuso por longo período.
Além disso, existem outras questões envolvidas, como:
- Ameaças diretas;
- Ameaças veladas;
- Ameaças aos filhos;
- Controle patrimonial e financeiro;
- Controle social;
- Abuso psicológico, físico e mental;
- Alienação parental;
- Etc
O abuso nunca é algo simples, que basta romper e está resolvido.
Muitas vezes, o abusador piora quando rompe, como foi o caso dessa jovem que teve o rosto tatuado.
Por isso é importante orientarmos as jovens para que percebam os sinais o quanto antes e rompam o ciclo do abuso e peçam ajuda o quanto antes, apesar de sabermos que nem sempre é possível.
A culpabilização da vítima
Uma situação bem comum em casos de abuso e que acaba favorecendo – e muito, o abusador, é a culpabilização da vítima ou de seus aliados.
Exemplos comuns de culpabilização da vítima:
- “Mas também, ela não largou dele porque não quis. Deve é gostar de apanhar” – sobre caso de mulher que não terminou, porque a mãe não a quis acolher
- “Apanhou e não separou por quê? Saísse fora, nem que fosse pra morar com os filhos na rua” – sobre caso de mulher que não se separou, porque teria que morar na rua com os 5 filhos
- “Retirou a queixa dias depois. Falei que ela ia voltar com ele? Ela é safada. Gosta desse jeito violento dele” – sobre caso de mulher que, mesmo após denunciar, teve a casa invadida e foi ameaçada para retirar a queixa, porque nada foi feito após a denúncia
- “Mulher adora é bandido. Homem decente elas descartam” – sobre mulher que se envolveu com homem abusivo, que também dizia isso quando era rejeitado
- “Ela pedia pra apanhar, né? Ele chegava nunca tinha jantar pronto” – sobre caso em que mulher apanhava por não fazer serviços domésticos
Exemplos comuns de culpabilização de aliados da vítima:
- “Por que a mãe não proibiu o namoro?” – onde, ao mesmo tempo, isenta o pai ausente e o culpado, culpando a mãe da vítima
- “Se fosse minha filha, nada disso teria acontecido e esse cara estaria morto” – diminuindo a atuação da mãe, se colocando como heróica, numa situação que jamais vivenciou e que, na prática, não faz ideia como agiria
- “Mas nenhuma amiga percebeu nada? Aff” – sobre caso em que amigas não teriam notado os abusos
Segundo a sociedade, o culpado sempre tem justificativas
Incrível como, para a sociedade, o culpado sempre tem motivos e justificativas.
Já, as vítimas e seus aliados, nunca tem. Sempre levam a culpa.
Essa dinâmica é ideal e favorável para que os abusos permaneçam e acabem sendo comuns, já que as pessoas vêem e nada fazem, por acharem que há justificativa.
Uma vez, eu estava sendo ASSALTADA e um rapaz de carro viu e nada fez.
Ao fim do meu assalto, ele veio e me disse que não fez nada, porque achou que era o meu marido me batendo e tentando me matar prensada na parede com a moto e que se soubesse que era assalto, teria jogado o carro pra cima do cara.
Ou seja, para ele, tudo bem um marido bater e tentar matar a esposa, por isso ele não se meteu para proteger a vítima.
Se dependesse dele, o marido mataria a esposa, afinal ele nem sabia o motivo, mas já havia escolhido um lado e não era o da vítima.
E a sociedade é assim. A cada justificativa, ela age igualzinho ao cara do meu assalto: escolhendo apoiar o abusador e não a vítima.O
O abusador sempre tem o benefício da dúvida, a vítima não. Ela sempre lida com as certezas absurdas da sociedade de que ela está equivocada, de que ela mentiu, de que ela merecia.
A sociedade defende e protege o abusador, mesmo quando não percebe isso.
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